Valdir Avelino – presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto, Guatapará e Pradópolis
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Uma sequência de decisões judiciais que favorecem ricos e governantes, e prejudicam a todos os demais, tem levado um número cada vez maior de trabalhadores a se questionar se o Brasil é mesmo capaz de cumprir a promessa de ser um estado democrático de direito. A Justiça, para ser justa de verdade, não pode ser justiça para um apenas um lado, como vem ocorrendo nos últimos anos em nosso país.
Há uma distância descomunal entre o que os trabalhadores imaginam ser o estado democrático de direito e a recente decisão liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, de suspender o piso salarial nacional da enfermagem.
Em resumo, depois de ouvir a choradeira do setor privado da saúde, o ministro do STF ficou preocupado com o que chamou de “eventuais impactos negativos da adoção dos pisos salariais impugnados”. Ora, num estado democrático de direito alguém pode querer segurar os custos do sistema de saúde privado às custas do salário pago a uma categoria profissional?
O que o STF está fazendo com a enfermagem hoje é apenas o prenúncio do que pode acontecer com outras categorias profissionais. Se um empresário não consegue manter-se no mercado por conta dos custos que uma lei validamente promulgada impõe, deve esse empresário recorrer ao STF ou cair fora do mercado?
Estamos ou não estamos no capitalismo, onde os ditos empresários competentes mantém-se e os incompetentes se mandam? Quer dizer então que os grupos particulares de saúde estão no mercado não por boas práticas, não por dinamismo e sim porque encontram-se favorecidos com a intensificação da exploração dos seus próprios trabalhadores?
Gostando ou não do atual Congresso e do atual chefe do Poder Executivo, o fato é que eles foram eleitos pelo povo para debaterem políticas públicas, avaliarem o impacto das leis que propõem, debatem, votam e promulgam. Cabe aos eleitos pelo povo avaliar o impacto financeiro de um piso salarial, assim como os riscos para a empregabilidade na área, ou a possibilidade de eventual redução ou melhora na qualidade dos serviços prestados na rede de saúde.
Esse padrão caótico de se ouvir com extrema atenção ao interesse dos ricos e prejudicar os trabalhadores, mina a credibilidade do tal estado democrático de direito. Não se sabe mais se o direito que vale hoje para um continuará valendo amanhã para outro, ou se uma autoridade judicial, de uma hora para outra, numa canetada, suspenderá os efeitos de uma lei amplamente debatida pelo Congresso Nacional e sancionada legitimamente pelo Poder Executivo.
Um ministro do Supremo pode muito, mas não pode ter o poder desmedido de suspender leis, senão em situações excepcionais, nas quais o interesse público e a defesa da Constituição demandem uma resolução urgente – o que não era nem de longe o caso.
A banalização da concessão de liminares por ministros do Supremos que suspendem leis, e o tempo demasiado que a Corte Superior leva para julgá-las em plenário, transformaram essa prerrogativa dos ministros em um poder arbitrário e exorbitante, o que é, obviamente, inaceitável em um estado que ainda pretende se apresentar como democrático e de direito. Essa suprema injustiça contra todos os trabalhadores da saúde precisa ser imediatamente desfeita.