O feitiço contra o feiticeiro

0
528

Todos lembram que no início de 2021, o governo municipal resolveu contratar, a peso de ouro, uma empresa privada para apresen­tar um estudo que acabou originando o que ficou conhecido como proposta de reforma administrativa. De forma apressada, sem dis­cussão ampla, a Câmara Municipal aprovou em abril do ano passado uma engenhoca, uma feitiçaria administrativa disfarçada de projetos, recheados de normas injustas, ilegais e inconstitucionais.

O estudo esquisito e vazio que deu origem à chamada reforma administrativa, contratado sem justificativa legal para a dispensa de licitação, custou R$ 690 mil aos cofres públicos. Desse im­bróglio, como se sabe, nada de bom resultou para a população. A reforma administrativa não passou de mais uma tentativa de burocratas privados de se assenhorear plenamente do Estado, a fim de redesenhar a seu serviço, as relações entre ele e a sociedade. E o que é ainda mais insuportável: cobrando horrores por isso.

O nosso Sindicato já havia apontado que no quadro de servidores públicos municipais tinha muito mais gente com capacidade técni­ca e conhecimento da realidade local do que na empresa particular contratada pelo governo para produzir um estudo dessa natureza. Os servidores públicos municipais ao longo de décadas estudaram, deba­teram, trabalharam e construíram isso tudo que hoje é Ribeirão Preto.

A empresa contratada para reunir em um documento um amontoado de pitacos vazios, como destacou o Ministério Público do Estado de São Paulo em uma ação civil pública, jamais havia realizado um projeto dessa natureza a um município de expressão nacional como Ribeirão Preto.

Isso que o governo chamou de “reforma administrativa”, contratada e paga a preço de ouro com dinheiro público, é a principal responsável pela precarização dos serviços públicos que a população de Ribeirão Preto hoje enfrenta. O “trabalho” prestado pela empresa privada resul­tou em projetos que só trouxeram prejuízos e transtornos aos servidores públicos municipais e abarrotam o Poder Judiciário de ações.

Alvo de queixas da população e de revolta e indignação dos ser­vidores, a “reforma administrativa” começou a apresentar também os seus custos para aqueles que a implementaram. A Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra muitos pontos da “reforma”, onde são réus o prefeito municipal e o presidente da Câmara de Vereadores.

Nesta semana, atendendo a pedido da Procuradoria-Geral de Justiça do Estado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) já suspendeu as novas contratações de funcionários comissionados pela prefeitura de Ribeirão Preto na Ação Direta de Inconstitucio­nalidade que a “reforma administrativa” é alvo. O resultado final deste questionamento judicial da reforma administrativa, pelo que tudo indica, tem tudo para ser indigesto para o governo.

Havia tempo, havia disposição e havia capital humano no pró­prio serviço público municipal para uma discussão racional sobre a reforma da administração pública. Mas, dispondo de folgada maioria na Câmara Municipal, no lugar de debater uma reforma administrativa, o governo resolveu tratorar e acabou aprovando a toque de caixa uma corrida descontrolada rumo ao abismo.

A arrogância e a ilusão de submeter o destino da cidade e os anseios dos seus servidores aos seus próprios desejos e apetites, levaram o governo a agir sem prudência, sem equilíbrio. Abraçou um projeto meia-boca com uma paixão desvairada. Sacrificando o servidor público, ignorando o interesse público, as ambições políticas tiraram o governo do mundo real.

O governo entregou a reforma administrativa à improvisação, ao amadorismo, à arte da feitiçaria administrativa. Apenas se esqueceu que feitiços, em boa parte das vezes, acabam se voltando contra os feiticeiros.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui